carta aqui deixada por charlie
Sou um canalha.Sim!
Na verdadeira acepção da palavra.
Um homem sem escrúpulos.
Uso o mesmo sorriso para pagar um café ou para vigarizar um tanso qualquer.
Na verdade, toda a minha vida foi passada a endrominar meio mundo.
Podem perguntar se sou rico.

Não me considero rico, isto é; neste mundo há homens muito mais ricos que eu.
Para dizer tudo como realmente é, e como sinto, precisava mesmo de dar um tremendo golpe para me sentir exultante e realizado.
Não me dá já qualquer satisfação seduzir e fazer com que uma mulher se me entregue.
Que me dê de mão beijada o seu coração, o seu corpo os seus pertences e a sua alma.
Deixo-a no acto continuo e isso não me pesa nem um grama na minha consciência. Depois de ter o que pretendo só posso seguir em frente, senhor dos meus intentos, rumo ao infinito da satisfação seguinte.
Casos houve em que nem para a cama fui, desaparecendo sem deixar rasto após ter o que queria. Na verdade, só o pensar nas suas lágrimas me dava uma sensação próxima do orgasmo. O saber-lhes em angústia esperando por mim, presas entre a dúvida e a sensação de terem sido enganadas, dava-me um gozo tremendo.
Sou assim, mas sou mais:Sei muito bem o que é falsificar assinaturas, alterar as quantias nos cheques e vender por bom preço acções sem valor. Já vendi propriedades que não me pertenciam e também vendi o mesmo lote de terreno a uma dúzia de pessoas.
Sei o que é conseguir apropriar-se dum Banco sem ter dinheiro. Sei o que é levar à ruína inúmeros accionistas e empresários que confiaram em mim. Mordo os lábios de satisfação e gozo puro só imaginar-lhes as mãos a afagar a arma que depois encostam à cabeça.
Acima de tudo sei o sabor único que existe na saliva do predador que sou e que me prezo de ser: - O sabor a sangue! -
Mas tudo isso, como já disse antes, não me diz nada neste exacto momento. À custa de tanto repetir as mesmas acções, elas perderam o impacto e o frenesim com que me costumavam prender e excitar.
As mulheres há muito que deixaram de ser minhas vítimas. Não por falta de desejo, mas por serem alvos demasiadamente fáceis.
Vender terrenos e acções, enganar gerentes bancários e tudo mais... já nada disso me move.

Algo em que tenha à minha frente toda uma multidão crente, em êxtase total e pendurada das minhas palavras. Uma sessão única onde sinta ter todas aquelas almas presas das minhas lágrimas, escorregando deliciadas e sofridas em cada palavra chorada e levadas ao meu bel-prazer pelos meandros tortuosos da minha sedução.
Agora que vivi todos estes anos.
Que já experimentei tudo o que há para experimentar, e onde nada me resta descobrir no campo onde sou Mestre, só vejo uma saída.
Vou candidatar-me a um cargo político....
Sei que irão votar em mim...
Charlie.